quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Pra que eu possa viver


Talvez eu não faça planos. Não trace metas tão lineares.
Talvez eu fique ainda mais calma. Me deleite no meu próprio ser inquieto e quente.
Eu quero a minha caminhada mais serena. Escolher como eu vou andar.

Eu vou sentir o mar mais próximo de mim. Me deixar levar pelas flores do campo, espalhadas pelo chão. Sentir meus pés tão próximos do céu ao passo que estão descalços na areia. Eu quero o alto. E necessito mais do vento me aquecendo, me levando, me batendo, me refrigerando, me dizendo. Eu quero o meu silêncio gritante, exprimido, liberto e calado. Quero ficar comigo mesma no meu ar, meu som, meu soneto de vivências latentes.

Quero ficar ao lado das coisas, do ser, do corpo, do coração. Quero ser par. Que seja ao tempo escolhido. E intenso, sentido. Não me importo com os espinhos. As flores do campo permanecem no chão. Eu as quero e as aceito se forem pegas ou arrancadas através do generoso e sensível ato.

Eu quero mais a música, pulsando nas minhas veias, na minha falta de exatidão. O som da melodia calada e entoada às mais diversas maneiras de me tocar. Eu quero a canção envolvendo o ar que respiro, me trazendo razão incerta e desmedida. Pra que eu não possa deixar de ouvir.

Eu vou voltar a ser criança pra dizer que amo. Sem medo. Vou sorrir pra mim mesma sem saber. Eu não vou ter respostas. Eu quero as perguntas. Eu vou tentar imitar para mim mesma, a alegria do meu cachorro quando me vê chegando após um árduo dia de trabalho. Quero ser alegre para mim, mesmo que cansada. Mesmo que o desânimo me peça para desistir. Quero me entreter com minha presença, me enfrentar.

Eu quero as minhas raízes. A busca pela liberdade da minha gente, a nossa história que tentaram apagar. Me lembrar de um passado que não vivi. Quero saudar um futuro mais livre e de paz. Viverei meu presente corrente, questionador, esperançoso. O balanço da minha cor. O som grave, retumbante e inquietante. O barulho da lembrança, do medo escondido, do grito liberto, da espera pelo amanhecer.

A poesia permanecerá como tatuagem, firmada no corpo e refletida nos olhos. Escreverá inrazões, saudades, desejos amortecidos, orações, desesperos, esperas e afastamentos. Quero a poesia calada, mentirosamente morta para viver a cada dia dentro de mim. Quero a poesia do ouvido com o próximo, da vontade amante, do se deixar arriscar. Quero a das perguntas. Aquela que me intriga, me instiga, me leva. Me permite.

Eu quero o beijo leve. E que me leve. Para o desconhecido lugar que me aconchega. E me deixa em paz. Eu quero o suspirar afoito. No meu ouvido. Como grito de insensatez. Quero palavras, não somente. Mas as quero. Como selos de sentimentos soltos. Quero proteção singela. Não quero horários. Eu quero o tempo da incerteza. Do fechar dos olhos. Eu quero dançar junto com a música. E quando ela findar, sorrir como quem não queria que acabasse.

Eu quero ouvir as vozes, que, unidas, tornam-se uma. Quero engrandecer a gentileza dos que saem de cena para deixarem a liberdade fluir, naturalmente, por ela mesma. Quero sentir o espaço presente. Quero me salvar dos meus conceitos. Quero a minha fé abastecedora do meu contato com a paz que é tão real e aprazível.

Quero estar perto.


Eu quero o mundo. Quero os lugares. O desconhecido. Quero as cenas. O passar rápido da viagem pelas diversas árvores, estradas. Pelas nuvens e pelo céu. Eu quero a realidade do irreal construído durante tantos anos. Eu não quero as desistências frustrantes. Eu preciso permanecer caminhando.

Não são metas. São vivencias incompletas e lembradas. Um dia já vivi. Um dia vou viver. Eu vou ficar mais próxima da simplicidade que me traz o sentido da bem-aventurança. Quero os versos e o inverso. Eu continuarei na inocência que me faz acreditar em mim. Nos próximos dias. No que eu não sei.

Me disseram que não há sol a sós.
Eu não estou sozinha.

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7 comentários:

Taiane Hardtke disse...

Lindo texto Dii!!!!

Richard Serraria disse...

Palavras carregadas de sentido, palavras para lembrar o vivido e fazer voar para longe o olvido. Poesia pura que sai das mãos de quem exige reconstrução, diária e lenta mas necessária para quem inventa!

Catarine disse...

Nossa, que vontade de me jogar pra dentro do teu texto. Quanta poesia, liberdade e simplicidade. Eu quero muitas dessas coisas pra mim também, e - como frisado por ti - na forma vivências, não como metas.

Rafael disse...

Com tudo o q li, nao sei o q t dizer. toda tua vida é maior ainda q pensas; me enche de coisas boas; vc é infinitamente surpreendente.

texto profundo!

Ricardo Cappa disse...

Caramba, Di! Que sensibilidade. Um texto assim não dá vontade de parar de ler! Parabéns, continue assim, guria!

Roberto Santos disse...

A Diiiii
Lindo demais o teu texto. Faz bem para alma.
beijos

Aleksander Aguilar disse...

E eu sigo dizendo...

um beijo