- Gondim
O metrô sacudia corpos de um lado para outro como se fosse programado para aquele ritmo. O atrito das rodas nos trilhos obedecia a uma métrica quase musical. Vendo as pessoas bailando, cabisbaixas, no vai e vem contínuo, inquietei-me com o silêncio. Ninguém conversava, ninguém ria; nenhum solilóquio maluco perturbava aquela valsa modorrenta. Responsabilizei o cansaço pelo entorpecimento coletivo. Ou seria a desesperança?
Antigamente, as filas dos bancos e das repartições públicas se transformavam em fóruns de cidadania. Repetiam-se as mesmas frases: “Por isso é que o Brasil não vai para frente”; “Isso é um absurdo”; “Até quando vamos agüentar?”; “Temos que fazer alguma coisa”.
Em um processo lento, não de repente, como queria o poeta, tal murmúrio foi-se calando. As pessoas param de reclamar, quando concluem que não adianta falar – gasta-se energia nos protestos. Instintivamente guardam seu grito para outro tempo, quando houver esperança.
O Brasil vem se calando. E seu sossego nasce da centenária percepção de que o clamor dos miseráveis nunca foi ouvido pela minoria rica e poderosa. Generalizou-se uma depressão coletiva, oriunda dessa quietude. O povo do tamborim, da cuíca, que faz samba numa caixa de fósforos, espirituoso e brincalhão, vem perdendo seu lado menino. Como lutadores de boxe cansados, baixaram a guarda; como ovelhas mudas, esperam o matadouro.
Enfraquecidas as resistências, reina essa curiosa bonança, responsável pelo caos social que tanto mata. Os miseráveis já haviam se calado há algum tempo, agora a classe média também emudeceu. No Brasil não há “panelaços” nem palanques onde enrouquecem tribunos eloqüentes e são poucas as passeatas reivindicatórias. Multiplicam-se apenas as marchas, os “showmícios” e os sindicatos sorteando prêmios. Os pusilânimes ganham espaço e repetem: “deixa acontecer para ver como é que fica”.
Oxalá, a brava gente brasileira recobre sua força criativa, restaure resistências e volte ao ringue em nome da sua dignidade. Filhos que não fogem à luta não podem se contentar em permanecer ordeiros e pacíficos. Gente que não teme quem deseja a própria morte não deve se conformar com a serenidade dos cemitérios.
Só quando voltar a indignação dos metrôs, ônibus e filas,
renascerá nossa esperança.
Um comentário:
Pois é didi, como havia te dito no MSN, gostei muito da forma como estás narrando o consenso do silêncio, ao qual, infelizmente, a sociedade brasileira parece estar acostumada.
Este torpor, que envolve a todos, é fruto do individualismo e do conformismo, com os quais têm se habituado a maioria dos trabalhadores no capitalismo contemporâneo.
A sociedade da informação tenta nos convencer diariamente sobre o que devemos ou não questionar e, assim, reflexões como a sua, apontam para um outro caminho.
Está na hora de olharmos para o lado, dar bom dia e boa noite, e, quem sabe, convidar aos nossos iguais para refletir sobre a importância de não ficarmos acomodados,num eterno ir e vir, sem propósito de MUDAR.
Assim como propões, acredito que precisamos promover o movimento que nos impulsiona a questionar o sentido de nossas vidas, rompendo com o silêncio que nos acomoda.
Forte abraço e parabéns pelo texto!
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