25 de novembro. 1960. Ditadura violenta de Rafael Leonidas Trujillo na República Dominicana efervescendo sangue e autoritarismo. Uma das mais ardentes ditaduras da América Latina assassina, covardemente, três mulheres militantes que lutavam por seus direitos: Pátria, Minerva e Maria Tereza Mirabal (as irmãs Las Mariposas).
Vinte anos depois, o Primeiro Encontro Feminista Latino-Americano e Caribenho, realizado em Bogotá, na Colômbia, traz a data do assassinato das Las Mariposas como o Dia Latino-Americano e Caribenho de Luta contra a violência à mulher.
Em 1999, a Assembléia geral da ONU declara a data como o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra a Mulher, justa homenagem ao acontecimento de Pátria, Miverva e Maria Tereza.
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25 de novembro de 2011. Mais um dia comum ao meu redor. Mas aqui dentro, devo dizer que, mais uma vez, reflexões maiores emergem em minha mente sobre a posição da mulher na sociedade. Já faz algum tempo que acompanho a mobilização – principalmente virtual – forte e articulada – no ativismo pelo fim da violência contra a mulher. Naturalmente, e por diversos motivos óbvios, fiz entrevistas com as organizadoras no ano passado, participei da blogagem e divulguei a iniciativa. Não foi preciso muito para ver que o crescimento, por si só, tomou uma força ainda maior, não apenas nas redes, mas principalmente, nos espaços de discussões e encaminhamentos que, com o passar do tempo, têm-se tomado um avanço relevante.
Hoje, blogagens, fóruns e uma série de manifestações individuais ou coletivas, sociais ou artisticas, declaram repúdio à violência contra mulher. Minha posição é simples, lógica e um tanto previsível: datas simbólicas devem existir como incentivo a uma luta constante e fortificada nos nossos dias, ainda que os focos na data sejam, sem dúvida, representações importantes para chacoalhar alguns temas necessários e muitas vezes esquecidos. E é por isso que me sinto a vontade e ao mesmo tempo na responsabilidade de exercer meu papel aqui em minha página pessoal, de não apenas como mulher, mas como cidadã.
Fui presenteada, propositalmente hoje, com o livro “Mulheres”, de Eduardo Galeano. Não bastasse a minha satisfação em receber o singelo gesto, foi uma surpresa também: é a segunda vez que ganho o mesmo livro. Coincidência? Não acredito tanto nela. Em menos de 5 meses, recebi duas vezes a mesma obra. E não é para menos que, ao folhear as páginas, a cada verso, palavra e descrição, me perpetuo em tantas linhas como bálsamo para algumas dores.
Páginas aliviantes.
Galeano é enfático, generoso e penetrante: de cara, enxerga a sensibilidade de morcegos causando risos em homens guerreiros; ressalta o riso como dádiva tão forte que se torna insuportável para fracos. E humaniza e fortifica, por fim, ainda mais o sexo feminino: “Os guerreiros resolveram que o riso fosse usado somente pelas mulheres e crianças”.
Ele ‘desconstrói’ forças e enxerga a natureza feminina não apenas como o eros envolvente e poderoso, mas lembra a sintonia materna com a terra e a natural semelhança do solo com a essência feminina: “Onde elas tinham ficado sentadas, ficou a terra toda regada de dentes”.
Mistura a natureza selvagem com a humana, de um lagarto que outrora via carne humana como sustento, hoje sente dor, paixão e sonha pela primeira vez na vida com uma mulher: “Sou um mendigo do amor, e com voz quebrada e alarmante tendência à rima, sussurra homenagens de agonia à dama que lhe roubou a calma e a alma”.
É fiel a sensações incapazes: “Não consigo dormir. Tenho uma mulher atravessada entre minhas pálpebras. Se pudesse, diria a ela que fosse embora, mas tenho uma mulher atravessada em minha garganta”.
De forma poética, em cada página, relata a história de diferentes biótipos e personalidades no mistério do mundo feminino, ao longo da história da humanidade. Relembra seus casos, inventa outros. Todos, com intensidade.
Folheio mais uma vez as páginas já lidas em pouco tempo, com aquela sensação de primeira vez. E, como num lapso, me teletransporto à composição que recebo da amiga Janete Flores. Dura como a realidade:
Vinte anos depois, o Primeiro Encontro Feminista Latino-Americano e Caribenho, realizado em Bogotá, na Colômbia, traz a data do assassinato das Las Mariposas como o Dia Latino-Americano e Caribenho de Luta contra a violência à mulher.
Em 1999, a Assembléia geral da ONU declara a data como o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra a Mulher, justa homenagem ao acontecimento de Pátria, Miverva e Maria Tereza.
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25 de novembro de 2011. Mais um dia comum ao meu redor. Mas aqui dentro, devo dizer que, mais uma vez, reflexões maiores emergem em minha mente sobre a posição da mulher na sociedade. Já faz algum tempo que acompanho a mobilização – principalmente virtual – forte e articulada – no ativismo pelo fim da violência contra a mulher. Naturalmente, e por diversos motivos óbvios, fiz entrevistas com as organizadoras no ano passado, participei da blogagem e divulguei a iniciativa. Não foi preciso muito para ver que o crescimento, por si só, tomou uma força ainda maior, não apenas nas redes, mas principalmente, nos espaços de discussões e encaminhamentos que, com o passar do tempo, têm-se tomado um avanço relevante.
Hoje, blogagens, fóruns e uma série de manifestações individuais ou coletivas, sociais ou artisticas, declaram repúdio à violência contra mulher. Minha posição é simples, lógica e um tanto previsível: datas simbólicas devem existir como incentivo a uma luta constante e fortificada nos nossos dias, ainda que os focos na data sejam, sem dúvida, representações importantes para chacoalhar alguns temas necessários e muitas vezes esquecidos. E é por isso que me sinto a vontade e ao mesmo tempo na responsabilidade de exercer meu papel aqui em minha página pessoal, de não apenas como mulher, mas como cidadã.
Fui presenteada, propositalmente hoje, com o livro “Mulheres”, de Eduardo Galeano. Não bastasse a minha satisfação em receber o singelo gesto, foi uma surpresa também: é a segunda vez que ganho o mesmo livro. Coincidência? Não acredito tanto nela. Em menos de 5 meses, recebi duas vezes a mesma obra. E não é para menos que, ao folhear as páginas, a cada verso, palavra e descrição, me perpetuo em tantas linhas como bálsamo para algumas dores.
Páginas aliviantes.
Galeano é enfático, generoso e penetrante: de cara, enxerga a sensibilidade de morcegos causando risos em homens guerreiros; ressalta o riso como dádiva tão forte que se torna insuportável para fracos. E humaniza e fortifica, por fim, ainda mais o sexo feminino: “Os guerreiros resolveram que o riso fosse usado somente pelas mulheres e crianças”.
Ele ‘desconstrói’ forças e enxerga a natureza feminina não apenas como o eros envolvente e poderoso, mas lembra a sintonia materna com a terra e a natural semelhança do solo com a essência feminina: “Onde elas tinham ficado sentadas, ficou a terra toda regada de dentes”.
Mistura a natureza selvagem com a humana, de um lagarto que outrora via carne humana como sustento, hoje sente dor, paixão e sonha pela primeira vez na vida com uma mulher: “Sou um mendigo do amor, e com voz quebrada e alarmante tendência à rima, sussurra homenagens de agonia à dama que lhe roubou a calma e a alma”.
É fiel a sensações incapazes: “Não consigo dormir. Tenho uma mulher atravessada entre minhas pálpebras. Se pudesse, diria a ela que fosse embora, mas tenho uma mulher atravessada em minha garganta”.
De forma poética, em cada página, relata a história de diferentes biótipos e personalidades no mistério do mundo feminino, ao longo da história da humanidade. Relembra seus casos, inventa outros. Todos, com intensidade.
Folheio mais uma vez as páginas já lidas em pouco tempo, com aquela sensação de primeira vez. E, como num lapso, me teletransporto à composição que recebo da amiga Janete Flores. Dura como a realidade:
Essa é uma noite qualquer,
como outra qualquer para aquela mulher
E pra tantas que passam na mesma aflição
e pra aquela que reza atrás do portão
é mais um dia qualquer...
como tantos ...qualquer!
Como tantos... E faça o que fizer
reze o que rezar
o motivo é sempre tão banal...
é todo dia sempre igual... seja útil, ou natal,
tudo é mesmo tão banal...
natural...normal... igual!
Total, banal, fatal!
E o silêncio mostra a cara tão valente
E o silêncio nessa terra é estridente...
total! banal... comum... fugaz...
fatal... tão assim... tanto faz...
logo a Ana... logo a Rita ...
logo sara... bem na cara...
logo inflama, reza a filha...
berra e cala ...
logo aninha, ..logo paira,
logo gela... logo vela...
nada fala... na capela...
mais um ano...muda o santo... e pede ela...
primavera, logo sara...
logo a Rita, logo a Vanda...
logo a Rosa e a Marina...
logo ela... logo a quem?
Logo a Rosa, logo a Vera
logo cala, logo gela...
logo o que...Qual o que?...
Logo a Penha!
como outra qualquer para aquela mulher
E pra tantas que passam na mesma aflição
e pra aquela que reza atrás do portão
é mais um dia qualquer...
como tantos ...qualquer!
Como tantos... E faça o que fizer
reze o que rezar
o motivo é sempre tão banal...
é todo dia sempre igual... seja útil, ou natal,
tudo é mesmo tão banal...
natural...normal... igual!
Total, banal, fatal!
E o silêncio mostra a cara tão valente
E o silêncio nessa terra é estridente...
total! banal... comum... fugaz...
fatal... tão assim... tanto faz...
logo a Ana... logo a Rita ...
logo sara... bem na cara...
logo inflama, reza a filha...
berra e cala ...
logo aninha, ..logo paira,
logo gela... logo vela...
nada fala... na capela...
mais um ano...muda o santo... e pede ela...
primavera, logo sara...
logo a Rita, logo a Vanda...
logo a Rosa e a Marina...
logo ela... logo a quem?
Logo a Rosa, logo a Vera
logo cala, logo gela...
logo o que...Qual o que?...
Logo a Penha!
Trocando freneticamente os canais após um dia cansativo de trabalho, no noticiário sensacionalista, encontro um jornalista performático esbravando palavrões a um violento homem possessivo que espancou a mulher por ciúme (?!). Mais violência. E é claro que não é só física. O dia 25 é outro qualquer como tantos outros para aquele casal. Aqueles tantos. Como em uma noite que cuidei do meu pai no hospital e presenciei, com meus olhos calmos e assustados, a cena de mulher ensangüentada, marido covarde e policial. Todos no Ponto que grita Socorro, em busca de medicação, avaliação, alívio e justiça. Tudo de volta a mente.
Tento voltar para Galeano, que entre contos e versos imaginários, é também real, e repito, penetrante.
Tento voltar. Tento... Volto e encontro: “Para que o amor seja natural e limpo, como a água que bebemos, haverá de ser livre e compartilhado. (...) Sem uma nova moral, sem uma mudança radical na vida cotidiana, não haverá emancipação plena.”
Meu peito estufado. Respiração desce com suspiro longo e calmo.
Já está tarde. E os olhos ficam um pouco embaçados. Talvez seja cedo, ou tarde – dependendo da perspectiva - para fazer alguns raciocínios ainda que lógicos. Preciso dormir. O livro vai para a cabeceira mais uma vez. Amanhã, hoje, é 26. Noticiários, hospitais, poesia, ativismo, realidade. Tudo outra vez. Mas a força... se sente mais forte.
Tento voltar para Galeano, que entre contos e versos imaginários, é também real, e repito, penetrante.
Tento voltar. Tento... Volto e encontro: “Para que o amor seja natural e limpo, como a água que bebemos, haverá de ser livre e compartilhado. (...) Sem uma nova moral, sem uma mudança radical na vida cotidiana, não haverá emancipação plena.”
Meu peito estufado. Respiração desce com suspiro longo e calmo.
Já está tarde. E os olhos ficam um pouco embaçados. Talvez seja cedo, ou tarde – dependendo da perspectiva - para fazer alguns raciocínios ainda que lógicos. Preciso dormir. O livro vai para a cabeceira mais uma vez. Amanhã, hoje, é 26. Noticiários, hospitais, poesia, ativismo, realidade. Tudo outra vez. Mas a força... se sente mais forte.
3 comentários:
Didi,
gosto muito do que escreves. e acredito cada vez mais na alma feminina. Bjus!
Ju, que honra te receber aqui! és uma referência pra mim, na escrita e na simplicidade! Forte abraço, querida.
belo post, preta. Beijones, Jun.
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