quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Apenas

Deixou as folhas rabiscadas para depois. Desistiu de tentar entender a realidade bruta e violenta, mas que sempre lhe ensinou tanto, mesmo sabendo que jamais chegará a uma conclusão nata e fria. Ligou aquela voz mais uma vez ao coração triste, vazio, porém atento. A voz permanecia na suavidade como da primeira vez. Mas o aperto do peito aumentava ao passo do tocar de cada nota do violão. Ao passo de cada timbre do piano e da simples voz, que insistia em permanecer ali. Tão unida a um conjunto de sentimentos e dores, saudades e recordações sem nem saber como. A voz cantava e exprimia emoção, sentimentos e pedidos de sinais. Tão perto, mas tão distante. Tão distante esse meu coração, mas almeja estar perto. Esse coração aqui.
A voz está longe. É apenas voz com emoções alheias, exprimidas para o além, para o longe. Nada parece estar tão ligado como antes ou como nunca esteve.

Ligou as luzes, tentou abrir a janela do quarto para ver se o brilho das estrelas que iluminavam aquela noite fria mostravam luz. Pediu resposta ao coração que incansavelmente se derretia a cada nota. Fechou o vidro, e ainda assim deixou as estrelas perceberem a tristeza diante daquela voz. Fechou os olhos, mas não conseguiu compreender ainda assim.

Precisou abrir os olhos. Tentou escrever poesia simples e calada, mas queria escrever tristeza e melodia. O piano voltava. E a voz suave, tão doce como a inocência de uma criança exclamava paixão involuntária. Exclamava pedidos de intensidade sem nem perceber. Sentiu vontade de fugir e abandonar os sentimentos. Quis pedir ao silêncio mais liberdade. Mas o silêncio não a perdoaria. Ela esquecera o que era perdão. Queria expressar suas exclamações e suas perguntas. Mas o medo foi maior que o rompimento com o silêncio. O medo a impediu de correr para longe e arriscar.

Desligou todas as luzes. Fechou a janela. Não se despediu das estrelas. Mas não tentou fechar seu coração e sua emoção irresistivel ao ouvir aqueles sons suaves que a levavam a tantos lugares.

Enxergou a realidade. Ela acordou do sonho. São apenas sons. E talvez, nada mais do que apenas, sonhos também.