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O que amo na vida? O imponderável; dançar na beira de abismos; tentar cruzar despenhadeiros em corda bamba; esperar o tiro de canhão na largada da maratona e não saber como vou terminá-la. Adoro desconhecer as notícias que o telefone trará quando se intrometer em meu sono. Como é fascinante sentir um medinho infundado antes de receber os exames do laboratório.
Como é bom poder dizer que cada dia é suficiente em seu próprio mal, e não fugir de acordar a cada alvorada, mesmo sabendo que naquela manhã poderei renascer das cinzas, como naufragar em problemas.
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A íris dos olhos é mágica; nela se escondem as intrigantes degradações humanas que se acumularam em milênios de história.
Sou fascinado com personagens depravados que preenchem páginas, capítulos, livros inteiros, e são seus olhos que mais despertam meu interesse. A perversidade humana me intriga porque faz o teatro existencial ser tão dramático; não fossem seus porões macabros, não haveria enredo para Shakespeare, Dante, Eça de Queiroz ou Machado de Assis. Como gosto de escrever, eu, igualmente, preciso deles.
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O que amo na vida? A singeleza das crianças que beijam roçando o nariz duas vezes; o altruísmo de quem oferece a casa para uma prostituta de esquina; o empenho do enfermeiro que faz serão gratuito ao lado do moribundo; a resiliência da mulher que asseia o marido que morre com Alzheimer; a doçura da filha que empurra a cadeira de rodas de sua mãe enquanto as duas passeiam pelo parque.
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[Tributo à Vida - Fotos: minhas, pelos anos de 2008 e 2009.]
Um comentário:
Genial. Me impressiono com essa sensibilidade sempre, Di.
Lembrei do tempo em que vc vivia fotografando pelo mundo, sinto saudades de suas imagens e de vc.. e de tudo.
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